“Namorar era a última coisa que eu pensava. Queria bater muito, chegar em casa com o mínimo de marca de soco no rosto. Isso era um troféu”. A conduta violenta que o professor de kickboxing Jorge Luis Silva de Medeiros descreve ao lembrar sua adolescência parece resumir a forma de agir de Zeca (Duda Nagle) em “Caminho das Índias”.
— O prazer que esse menino e sua turma têm em agredir era o mesmo que eu tinha aos 16, 17 anos. Eu me vangloriava em ser um pitboy — conta Jorge, de 38 anos, que de 1988 a 1993 só queria saber de pancadaria.
A história de Jorge é a quarta da série “Caminhos da vida”. O especial mostra que tramas como as da novela de Gloria Perez não existem apenas na ficção. O professor lembra que qualquer lugar virava uma arena de luta:
— Eu só queria brigar e tinha uma galera que era boa nisso. Se soubéssemos que a turma rival estava jogando bola numa quadra, íamos lá afrontá-los. Nos bailes funks, já chegávamos arrebentando.
Até que em 1992, Jorge começou a fazer caratê. Ele confessa que aproveitou as técnicas da luta nas brigas de rua. Só quando foi para o tae-kwon-do e depois para o kickboxing, em 1993, deixou de ver sentido na agressão gratuita.
— A arte marcial mudou meu pensamento. Passei a entender o propósito da vida. Comecei a participar de competições e a descarregar a agressividade na luta. E, pasme, a ter medo de me envolver em briga — afirma o professor, que há quatro anos tem um projeto para resgatar jovens da violência.
O esporte foi a salvação
No dia 15 de novembro de 1989, a Proclamação da República completava um século. Mas, para Jorge Luis de Medeiros, a data marca uma espécie de renascimento. Durante uma briga, na
saída de um baile funk, o então adolescente levou um tiro na cabeça.
— Pensei que fosse uma pedra, porque era com isso que minha galera e a outra estavam atacando. A sorte foi que não atingiu o cérebro, a bala ficou presa no crânio — conta o Zeca da vida real, que, mesmo com o sangue escorrendo no rosto, queria continuar na batalha.
Os oito meses que Jorge ficou em casa, após fazer uma cirurgia, não fizeram rever sua postura:
— Fiquei guardando mágoa, ódio... Quando fui para a rua, estava seco por briga.
E como a família agia diante de um filho problemático?
— Eles só foram saber das minhas arruaças quando levei o tiro. Diferentemente dos pais do Zeca, que acham que é apenas molecagem o que o filho faz, os meus se preocupavam. Só que não tinham controle sobre mim. Como Zeca, eu fazia o que bem queria — conta o professor, que ainda se envolveu com drogas.
No esporte, Jorge refez sua imagem. Venceu campeonatos de tae-kwon-do e foi campeão brasileiro profissional de kickboxing em 1996. Criou a Equipe Jorge Turco, que mais tarde ganhou um braço: o Ministério Lutando por Vidas, projeto que assiste jovens em situações de risco social, fazendo com que encontrem no esporte uma vida saudável e proveitosa.
Há quatro anos, Jorge levou o projeto ao presídio Muniz Sodré, que faz parte do Complexo Penitenciário de Bangu.
— O esporte é um meio de inclusão social. Além dele há outras oficinas, como de teatro e música — diz Jorge, que tem na sua trajetória a maior bandeira para seu trabalho: — As pessoas me respeitam pelo fato de eu ter me transformado. Refleti sobre o meu passado e
projetei o que queria para o meu futuro. Hoje minha luta maior é pela vida.
Veja também no site Extra online :
http://extra.globo.com/lazer/sessaoextra/posts/2009/08/06/novela-sem-ficcao-jorge-luis-o-zeca-da-vida-real-211519.asp
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